Monday, June 13, 2005

Adeus


Adeus

Ja gastamos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou nao chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastamos tudo menos o silencio.
Gastamos os olhos com o sal das lagrimas,
gastamos as maos a forca de as apertarmos,
gastamos o relogio e as pedras das esquinas
em esperas inuteis.

Meto as maos nas algibeiras e nao encontro nada.
Antigamente tinhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
as vezes tu dizias: os teus olhos sao peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possiveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquario,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje sao apenas os meus olhos.
E pouco mas a verdade,
uns olhos como todos os outros.

Ja gastamos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
ja nao se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
so de murmurar o teu nome
no silencio do meu coracao.

Nao temos ja nada para dar.
Dentro de ti
nao ha nada que me peca agua.
O passado e inutil como um trapo.
E ja te disse: as palavras estao gastas.

Adeus.

Eug�nio de Andrade

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